Quando o mundo deixou Doha em dezembro de 2022, o Catar já estava planejando seus próximos passos. A Copa do Mundo não foi um ponto final, foi um ponto de partida. Para um país que há muito vê o esporte como um projeto nacional e um catalisador regional, a dúvida nunca foi se o ritmo continuaria, mas sim como.
O Flashscore visitou os escritórios da a principal divisão do país, para entender melhor a estratégia esportiva do Catar e como ela se diferencia dos vizinhos que gastam alto, como a Saudi Pro League, que tem sido destaque nas últimas janelas de transferências.
A palavra “sustentável” talvez não seja a primeira que vem à mente quando se fala do Catar, com seus arranha-céus luxuosos e ar-condicionado por toda parte, mas faz sentido quando ligada à estratégia de futebol do país.
Nem sempre foi assim. “Há 20 anos, precisávamos ser vistos, então trouxemos nomes como Batistuta e Effenberg para cá,” conta Ahmed Abbassi, Diretor Executivo de Competições e Desenvolvimento de Futebol da liga.
“Mas hoje estamos muito além dessa fase. Respeitamos o que a Arábia Saudita está fazendo, mas seguimos um caminho diferente”, afirma.
Pelo Golfo, a Saudi Pro League ganhou manchetes com contratações de peso como e , além dos altos investimentos que acompanham essas contratações.
O Catar também conta com nomes conhecidos das principais ligas europeias, mas optou por um modelo mais discreto. Graças à sua estratégia, o valor de mercado da QSL subiu de 150 milhões de euros em 2020/21 para 450 milhões na temporada atual.
“O que importa para nós é um futebol atrativo, competitivo e sustentável,” afirma Abbassi. “Sustentável no crescimento da liga e da nossa seleção, e também financeiramente. Esse é um aspecto fundamental na forma como construímos nossa governança, regulamentos e protegemos nossos jogadores locais, ao mesmo tempo em que trazemos estrangeiros que agregam valor.”

Isso também significa que o Catar não quer ser apenas um destino de aposentadoria para jogadores no fim da carreira.
Cerca de 35% dos jogadores estrangeiros da QSL têm menos de 25 anos. Alguns são nomes conhecidos; outros são jovens promissores. Por exemplo, o , clube mais vitorioso do país, tem o experiente astro como referência, mas um de seus reforços europeus é , jovem de 19 anos formado na base do Barcelona. “Só o nome não basta; o desempenho é o que conta,” destaca Abbassi.
Regulamentos financeiros exclusivos
A QSL não precisa seguir as regras do Fair Play Financeiro, já que elas foram criadas pela UEFA. Em vez disso, a liga desenvolveu seu próprio conjunto de normas chamado “Controle Financeiro”.
Cada clube define seu orçamento com base em patrocínios e receitas de transmissão. Esse orçamento é transferido diretamente para uma conta gerenciada pela liga, garantindo total transparência à QSL.
“Assim, garantimos que todos recebam exatamente na data certa. Técnicos, jogadores, todos,” explica Abbassi. “Atrasos salariais acontecem até nas principais ligas europeias, e nós quisemos evitar isso,” acrescenta.

As regras são simples: Sem liquidez? Sem contratação. “Você não pode contratar um jogador ou técnico se não tiver o orçamento disponível na conta,” diz Abbassi. “Aqui, você precisa ter o dinheiro agora. Não há margem para negociação.”
O resultado não é apenas zero dívidas na liga, mas, talvez mais importante, a credibilidade crescente no cenário do futebol mundial. “Essa regra ajudou nossa imagem no mundo do futebol,” acrescenta Abbassi. “Mostrou que temos uma estrutura profissional.”
Fazer o necessário
O ex-árbitro da FIFA Hani Ballan é CEO da QSL há mais de uma década e está entre os líderes que buscam transformar o Catar em um polo esportivo global. Não só no futebol, mesmo que esse seja seu foco principal.
“Temos um ditado aqui: não fazemos apenas o nosso melhor, fazemos o que é preciso,” diz Ballan. “Isso vale para sediar a Copa do Mundo da FIFA, para desenvolver nossa liga ou para qualquer evento futuro.”
A próxima fase já está em andamento. O Catar vai sediar a Copa do Mundo de Basquete FIBA 2027, e autoridades já demonstraram interesse em concorrer aos Jogos Olímpicos de 2036. Ambos se encaixam em um projeto nacional que vê o esporte como investimento de longo prazo em imagem e identidade, mas também em infraestrutura.

Os estádios construídos para a Copa do Mundo de 2022 continuam sendo utilizados até hoje para o futebol e também para a Diamond League, e um deles deve receber parte do torneio de basquete daqui a dois anos.
“Havia muitas dúvidas antes da Copa do Mundo,” lembra Ballan. “Mas no fim, foi incrível. Ninguém pode questionar nossa capacidade de sediar, a organização, a hospitalidade… Foi um evento gigantesco para nós e só nos fez crescer.”
O sentimento predominante ao conversar com qualquer dirigente esportivo em Doha é claro: eles querem usar o modelo da Copa do Mundo da FIFA, que deu ao país maior visibilidade no esporte, para garantir que torcedores e atletas fiquem satisfeitos ao participar de torneios no Catar.
“Não impomos hierarquia,” garante Ballan. “Todos trabalhamos juntos pelo crescimento comum do país e da região.”